28 novembro, 2012

Mortal Loucura


Na oração que desaterra........................... aterra,
Quer Deus que a quem está o cuidado....... dado
Pregue que a vida é emprestado............... estado,
Mistérios mil que desenterra.................... enterra.

Quem não cuida de si que é terra.............. erra,
Que o alto Rei por afamado..................... amado
E quem lhe assiste ao desvelado............... lado
Da morte ao ar não desaferra.................. aferra.

Quem do mundo a mortal loucura............ cura,
À vontade de Deus sagrada...................... agrada
Firmar-lhe a vida em atadura................... dura.

Ó voz zelosa que dobrada......................... brada,
Já sei que a flor da formosura................... usura
Será no fim desta jornada........................ nada.

Música: José Miguel Wisnik
Sobre poema de Gregório de Matos (1636/1695)
© 2005 – Álbum “Onqotô” - José Miguel Wisnik / Caetano Veloso
Composição para o espetáculo do Grupo Corpo.



21 novembro, 2012


A criatividade é, depois do amor, a maior qualidade do ser humano.

Shadow Art por Kumi Yamashita

15 novembro, 2012

mulher, vida



Todas as Vidas

Vive dentro de mim
uma cabocla velha
de mau-olhado,
acocorada ao pé
 do borralho,
olhando para o fogo.
Benze quebranto.
Bota feitiço…
Ogum. Orixá.
Macumba, terreiro.
Ogã, pai-de-santo…
Vive dentro de mim
a lavadeira
do Rio Vermelho.
Seu cheiro gostoso
d’água e sabão.
Rodilha de pano.
Trouxa de roupa,
pedra de anil.
Sua coroa verde
de São Caetano.
Vive dentro de mim
a mulher cozinheira.
Pimenta e cebola.
Quitute bem feito.
Panela de barro.
Taipa de lenha.
Cozinha antiga
toda pretinha.
Bem cacheada de picumã.
Pedra pontuda.
Cumbuco de coco.
Pisando alho-sal.
Vive dentro de mim
a mulher do povo.
Bem proletária.
Bem linguaruda,
desabusada,
sem preconceitos,
de casca grossa,
de chinelinha,
e filharada.
Vive dentro de mim
a mulher roceira.
Enxerto de terra,
Trabalhadeira.
Madrugadeira.
Analfabeta.
De pé no chão.
Bem parideira.
Bem criadeira.
Seus doze filhos
Seus vinte netos.
Vive dentro de mim
a mulher da vida.
Minha irmãzinha…
tão desprezada,
tão murmurada…
Fingindo ser alegre
seu triste fado.
Todas as vidas
dentro de mim:
Na minha vida
a vida mera das obscuras!

(Cora Coralina)